No inicio de Fevereiro de 2019, numa das minhas incursões regulares à Lagoa de Óbidos, encontrei dois Perna-verde (Tringa nebularia). As aves estavam relativamente perto, em alimentação na margem da lagoa. Aproveitei para tirar algumas fotografias com o objectivo de praticar a atribuição de idade a Perna-verde, numa altura do ano em que é mais difícil. Achei sempre, salvo algumas excepções, relativamente complicado dar idade a limícolas. A grande variabilidade nos padrões das penas e na intensidade e extensão da muda, faz com que os indivíduos assumam plumagens difíceis de interpretar. Resumo da muda em Perna-Verde: Adultos Pós-nupcial - Muda completa. Uma parte dos indivíduos começa a muda de primárias ainda nos território de nidificação e suspende durante a migração, retomando nas zonas de Invernada. Outros começam a muda de primárias já nas áreas de Invernada. Pré-nupcial - Parcial. Variável, mas geralmente inclui mudar as penas do corpo, algumas coberturas e terciárias. Juvenis Pós-juvenil - Parcial. Inclui um número variável de coberturas, penas do corpo e penas da cauda. Pré-nupcial - Parcial. Variável, mas, tal como nos adultos, pode incluir várias coberturas, rectrizes e terciárias. Algumas aves podem mudar as primárias exteriores (Prater, et all, 1977). A separação de 1º Inverno para adulto no Outono é, de forma geral, relativamente fácil. Um dos caracteres mais mencionados na literatura é a forma das coberturas médias. Onde a típica cobertura média tem uma margem clara interrompida na ponta por uma divisão castanha (Fig. 1). No inicio do Inverno os juvenis já renovaram uma boa parte das coberturas durante a sua muda parcial pós-juvenil, assemelhando-se cada vez mais aos adultos. Sabendo que os adultos efectuam uma muda pós-nupcial completa, para identificar aves imaturas há que procurar por penas de juvenil que ficaram por mudar. Esta tarefa vai ficando cada vez mais complicada à medida que o Inverno progride e o desgaste em adultos e juvenis tendem a esbater diferenças significativas nos padrões da plumagem. Um factor a ter em conta é a qualidade inferior das penas de juvenil que levam a um desgaste um pouco mais acentuado que nos adultos. Este desgaste é particularmente evidenciado pela coloração. Por exemplo, as pequenas e médias coberturas tendem a ser mais castanhas nos imaturos do que nos adultos. Outra característica que pode ajudar na separação de classes etárias no final do Inverno é o desgaste, forma e coloração das primárias e secundárias. Na minha opinião, um dos caracteres mais fiáveis, já que é menos sujeito a variabilidade que as coberturas. Atendendo ao padrão de muda de Perna-verde, os imaturos deverão manter as primárias de juvenil, por vezes até à próxima muda completa (Agosto-Outubro). É necessária alguma precaução durante a Primavera, já que parece haver algumas aves imaturas que renovam as primárias exteriores, o que iria resultar em aves que apresentam a ponta das primárias "frescas" quando observadas no campo. Neste caso, é necessário uma fotografia com asa aberta para ver o limite de muda, entre as PP exteriores (tipo adulto) e interiores (juvenil). As duas aves que observei na Lagoa de Óbidos apresentavam uma coloração das partes superiores ligeiramente diferente. A ave 1 (frente na foto), apresentava tons mais cinzentos em praticamente todas as coberturas, classifiquei esta ave como adulto. A ave 2 (atrás na foto) apresentava algumas coberturas castanhas, assim como penas de voo com mais desgaste, classifiquei esta ave como imaturo (2º ano calendário). Nesta foto podemos ver o padrão da cabeça, que é ligeiramente diferente nas duas aves. A ave 1 (frente na foto) apresenta a garganta mais branca e riscas cinzentas na lateral do pescoço mais definidas. Na ave 2 (atrás na foto) o riscado é mais fino, criando uma aparência menos "limpa" da cabeça e pescoço. A ave 1 (frente na foto), apresenta também duas penas terciárias muito "frescas" e de cor cinzenta na asa esquerda, não tenho a certeza se aquiridas na muda pós-nupcial tardia ou muito recentemente na muda pré-nupcial. Assim sendo, é bem possível que a ave esteja a mudar outras coberturas e/ou penas de corpo. Ave 1 - Penas de voo com pouco desgaste, apresentando um rebordo branco bem definido nas secundárias e primárias interiores. As partes superiores apresentam uma maior uniformidade de coloração, com as coberturas pequenas e médias cinzento escuro. Ave 2 - Penas do voo com algum desgaste, com o rebordo claro nas secundárias e primárias interiores pouco definido. As partes superiores apresentam áreas com coberturas castanho claro, em particular nas pequenas e médias coberturas. Note-se a grande cobertura mais interna da asa direita com bastante desgaste e de cor castanha. Comparação da forma e nível de desgaste nas penas de voo das duas aves. (Ave 2 - esquerda, Ave 1 - direita). Nota-se o rebordo superior das penas mais largo na ave 2, apresentando uma ponta mais "romba", característica das penas de juvenil. O desgaste e padrão das penas caudais, em particular da R1 e R5 tem sido apontado como uma forma de separar juvenis e adultos. Creio que poderá funcionar em alguns inds., no caso destas duas aves, pelo que consegui perceber no campo e nas fotos, parece-me que ambas sustituiram as penas caudais, invalidando assim este critério. Conclusão Dar idade a Perna-verde no final do Inverno, ou inicio de primavera, pode ser uma tarefa complicada. A extensão da muda pós-juvenil pode levar a que alguns indivíduos fiquem com plumagens muito parecidas com a dos adultos. Assim, quando nos deparamos com um Perna-verde deveremos ter em consideração o seguinte: - Verificar se existem coberturas médias com o típico padrão de juvenil - Ver se ocorrem diferentes gerações de penas nas coberturas, em particular se existem penas castanhas e com bastante desgaste na plumagem. Deve haver alguma prudência porque os adultos no final do Inverno podem exibir também diferentes gerações de penas, fruto da muda pré-nupcial. Assim, para ser um imaturo, as penas mais antigas terão de ser castanhas e não cinzentas. - Observar o desgaste nas primárias, caso tenha desgaste a ave deverá ser um imaturo. - Na bibliografia é referido que algumas aves imaturas podem muda as primárias exteriores na muda pré-nupcial. Não sei exactamente até que ponto isto acontece nas populações que Invernam ou passam por Portugal. Assim, se uma ave no final do Inverno, ou inicio da Primavera, exibir pontas das primárias "frescas" poderá ser um imaturo. Neste caso, é necessário verificar se existem coberturas de juvenil ou, caso se consiga uma foto de asa aberta, se existem limites de muda nas primárias interiores. - Caso se consiga uma foto de asa aberta, poderemos também observar a forma das primárias e secundárias, aparentemente, parece ser diferente em adultos e imaturos (preciso de testar melhor esta teoria) - Verificar o desgaste das penas caudais, alguns juvenis parecem reter penas caudais na muda pós-juvenil. Agradecimentos Ao Peter Potts, Pedro Lourenço e Leila Duarte. Bibliografia Demongin, L. 2016. Identification guide to birds in the hand. Laurent Demongin (privatly publish)
Message, S. and Taylor, D. 2005. Field Guide to the Waders of Europe, Asia and North America. Christopher Helm, London. Meissner, W. 2008. Ageing and sexing series. Part 3: Ageing and sexing the Common Greenshank Tringa nebularia. Wader Study Group Bull. 115(3): 182–184. Prater, A.J., Marchant, J.H. & Vuorinen, J. 1977. Guide to the Identification and Ageing of Holarctic Waders. BTO Tring.
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